Parada, numa fila onde aguardava a minha vez para ser atendida, escutava a conversa telefónica de quem se encontrava atrás de mim. Falava muito alto. Era impossível não ouvir. Tentei abstrair-me. Não consegui. A jovem não procurava conversar discretamente. Estaria convencida do interesse daquele monólogo e eu só pensava no desconforto. No desconforto daquela exposição.
Sempre me inibiu estar em público, a conversar com alguém, de assuntos particulares, e sentir que as pessoas estavam a ouvir a conversa. Durante um período da minha vida, viajei diariamente de comboio. Sozinha. Como companhia um livro. Sempre um livro. Escolhia a carruagem mais vazia porque o silêncio me ajudava à leitura. Mas nem sempre o objetivo era conseguido. E muitas vezes tive de “ouvir” as conversas dos que partilhavam aquela viagem.
Era intrigante! A naturalidade e espontaneidade com que algumas pessoas falavam das suas vidas, problemas e glórias, sem o desconforto de saberem que um grupo de estranhos as ouviam, e mais, podiam fazer juízos de valor do que era ali exposto numa conversa informal, mas muito pessoal.
E continuam a intrigar-me. Estas pessoas que fazem desfilar aspetos privados das suas vidas na praça pública.
E interrogo-me se este espaço também não será isso. Expor pormenores da minha vida na esfera pública. Ou qual é exatamente a fronteira entre o privado e o público?
Mas tudo isto começou com a conversa da menina na fila, atrás de mim. A conversa de que não consegui fugir e que me levou a outros pensamentos. Explicava ela ao interlocutor como, tão nova, já tinha tantas conquistas. E não, não se referia a conquistas amorosas, mas o que ela considerava conquistas profissionais e pessoais.
E eu a fugir de ouvir, levei o meu pensamento para outras conquistas. As pessoas que me conquistam. Que conseguiram o estatuto de indispensáveis na minha vida, para minha felicidade, para me tornarem melhor. As pessoas!
E logo depois outra questão brotou. Como é possível que durante anos, conheçamos uma pessoa e ela esteja lá, exista sem nos afetar, sem mexer particularmente com a nossa existência? E depois o contrário. Pessoas que aparecem do nada e que, de forma espontânea, imediatamente nos conquistam. As razões são múltiplas e diversas. Algumas apenas porque conseguem ser humildes, extraordinariamente educadas e de bem com a vida. Mesmo que essa vida não seja fácil.
Foi por isso que fiz este bolo. Um bolo para celebrarmos o aniversário do T. que, silenciosamente entrou no nosso trabalho, numa passagem rápida de estágio e imediatamente nos conquistou pelas qualidades que referi.
Parabéns T.
Bolo de pêra e farinha de alfarroba
(inspirado no blog A culpa é das Bolachas)
Cobertura
120 g de farinha
80 g de açúcar amarelo
1 colher de chá de canela
1 colher de chá de gengibre
80 gramas de manteiga
Bolo
175 g de manteiga
175 g de açúcar amarelo
3 ovos
110 g de farinha
70 g de farinha de alfarroba
3 colheres de sopa de leite
1 colher de sopa de sumo de limão
3 pêras médias
Para a cobertura, juntei numa taça a farinha, a manteiga, o açúcar, o gengibre e a canela. Misturei bem com as mãos e formei uma bola. Embrulhei em película aderente e levei ao frigorífico durante 30 minutos.
Para o bolo, bati a manteiga amolecida e o açúcar até ficar em creme. Juntei os ovos um a um e fui batendo. Juntei o limão e o leite. Bati tudo muito bem. Cortei as pêras em fatias finas. Peneirei as farinhas para o creme. Envolvi bem. Dividi em duas partes. Forrei uma forma redonda de fundo amovível com papel vegetal. Coloquei parte da massa. Depois dispus a fruta. Cobri com a outra parte da massa. Voltei a colocar uma camada de fruta. Retirei a bola de massa do frigorífico e coloquei esfarelada de forma a tapar toda a fruta e obter o efeito crumble. Levei ao forno durante cerca de 50 minutos a 180º. Deixei arrefecer na forma cerca de 10 minutos e depois na rede.
Maio 29, 2012 at 10:54 pm
Mais uma vez uma reflexão que partilho. As pessoas devem ser o mais importante. Conquistar ou ser conquistado, no sentido mais pleno que pode haver, é muito gratificante. O T. vai certamente ser também ele conquistado por este bolo.
Um beijo
Babette
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Maio 29, 2012 at 11:00 pm
Olá, Guida.
Antes de mais, parabéns ao teu colega. Em relação à conversa da menina, também me incomodam essas pessoas que acham que os telefonemas são para toda a gente ouvir. Principalmente quando o teor das conversas roçam o foro íntimo. Não acho que os nossos blogues tenham nada a ver com isso. Expomo-nos só até certo ponto. Até onde achamos confortável ir. Para além disso, ao contrário da menina que “obrigou” toda a gente a ouvir a conversa, aos nossos espaços só vem quem nos quer ler. Sabes, ultimamente tenho pensado muito nesta questão da exposição. Principalmente porque alguém muito chegado me perguntou se eu não achava que me estava a expor demasiado. Depois de ter refletido sobre os meus posts, cheguei à conclusão que não. Sinto-me confortável. E é isso que interessa, não é? Desculpa o desbafo, mas veio a propósito 🙂
Beijo,
Ilídia
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Maio 30, 2012 at 4:40 pm
G. tem óptimo aspecto!! e se for com as pêras Rocha do Oeste tanto melhor. Mas dá um pouco de trabalho a fazer não? Vou testar… 😉
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